As relações de emprego se regem basicamente pela lógica do poder diretivo do empregador que consiste em organizar, fiscalizar e disciplinar os eventos vinculados à atividade laboral.
Concomitantemente a isso, há em curso um processo irreversível de evolução tecnológica criado a partir das famosas inovações disruptivas.
Esse cenário trouxe novos paradigmas ao ambiente de trabalho, criando novas ferramentas de comunicações entre empresas, funcionários, fornecedores e também entre os próprios empregados.
Portanto, a dinâmica aumentou e a velocidade da transição de dados também.
Até por isso fora criada no Brasil a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018) - LGPD, que entrará em vigor de forma plena a partir do ano de 2.020.
Esse regramento dispõe sobre a proteção de dados pessoais e fora inspirado no Regulamento Geral de Proteção de Dados na União Europeia, ou GDPR, na sigla em inglês.
Em ambos os institutos o objetivo é o mesmo: proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Isso traz à tona um ponto importante: qual o limite do exercício do poder diretivo do empregador ao efetuar o monitoramento digital dos seus empregados?
Não restam dúvidas de que o empregador deve, sempre, respeitar à privacidade do seu empregado, assim como a sua intimidade, honra e imagem (artigo 2º, incisos I e IV, da LGPD).
Uma medida que pode auxiliar a compreender esse ponto é que o empregador, por exemplo, não pode no ambiente não virtual colocar câmeras dentro de banheiros e/ou vestiários com intuito de vigiar as ações dos empregados, embora possa alocar câmeras em locais de frequência coletiva com o objetivo de resguardar seu patrimônio.
Isso significa que o poder de fiscalização no ambiente digital segue a mesma lógica: é possível dentro de um limite do razoável.
Logo, o monitoramento digital, quando realizado, deve ocorrer apenas no campo das ações do empregado dentro do seu expediente de trabalho e dentro dos espaços concedidos pela empresa para o exercício de suas funções.
Nesse sentido, não se pode de forma alguma ferir a privacidade do trabalhador.
No entanto, não restam dúvidas de que o empregador não tem apenas o direito de realizar o monitoramento digital porque a lei lhe impõe o a responsabilidade objetiva em relação aos atos praticados por seus empregados, nos termos Código Civil (artigo 932, inciso III) e, ainda, pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, nos termos da denominada Lei Anticorrupção (artigo 2º da Lei 12.846/2013).
Então, se a lei impõe a responsabilidade à empresa, a mesma lei outorga poderes ao empregador de fiscalizar os atos de seus empregados e representantes.
Assim, é necessário sempre sopesar os limites desse poder de monitoramento digital.
E o primeiro passo para que isso ocorra de forma correta é a criação de uma política interna que crie regras determinado se é possível, por exemplo, usar no horário de expediente qualquer outro e-mail diverso do e-mail corporativo e/ou limitando o acesso a determinados sites.
O cenário se torna mais complexo em situações definidas como “bring your own device”, que em tradução livre significa “traga seu próprio dispositivo”, já que nessa hipótese é difícil distinguir as ferramentas de trabalho das de uso pessoal, uma vez que o computador utilizado, por exemplo, seria do próprio empregado, o que em tese protegeria as informações ali discriminadas em razão, por exemplo, do que prevê o artigo 7º do Marco Civil da Internet e/ou o artigo 154-A do Código Penal.
Diante de todas essas peculiaridades, as ações do empregador devem sempre partir de dois pressupostos: respeito à privacidade e observância da razoabilidade.
Para tanto, compete as empresas estabelecer regras claras sobre a utilização das ferramentas de trabalho e sobre os limites do monitoramento digital.
Seguindo essa lógica, serão respeitados tanto os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade do empregado, como a proteção dos dados empresariais e a respectiva confidencialidade necessária ao universo corporativo.
Texto de Me. William de Aguiar Toledo. Advogado. Sócio da Aguiar Toledo Advogados. Mestre em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Doutorando em Direito pela Universidade Autônoma de Lisboa – UAL.