O cenário político-econômico brasileiro ampliou exponencialmente, nos últimos anos, os riscos negociais.
A prova disso é que o Brasil, no âmbito das três principais agências de rating (Fitch, Standard&Poor's e Moody´s), continua com grau de avaliação especulativo, sendo que o atual cenário o mantém longe do grau de avaliação de investimento.
E o resultado objetivo disso foi o crescimento contínuo de empresas em situação de dificuldade operacional.
Por exemplo, em 2015, ano em que a lei de falências e recuperações judiciais e extrajudiciais completou dez anos, aproximadamente 7 mil empresas já tinham ingressado com pedidos de recuperação judicial.
Esse panorama se agravou após o início da operação lava-jato, haja vista o alto de impacto que a investigação gerou em um segmento que era a locomotiva do Brasil: a construção pesada.
Nesse ambiente negativo, muitas das maiores empresas brasileiras se viram diante de uma decisão difícil: falir ou tentar a recuperação com o auxílio do poder judiciário.
A decisão além de envolver um elevado grau de responsabilidade, sobretudo porque é a própria reputação da sociedade que se encontra em jogo, traz consigo um universo de obrigações a serem cumpridas, obrigações que são tantas e tão severas que fizeram com que apenas 6% das empresas que ingressaram com pedidos judiciais de recuperação conseguissem sair dele sem pedir falência.
Contudo, todo empreendedor sabe que não há negócio sem riscos, razão pela qual não há como ingressar nesse cenário de recuperação sem incorrer em novos desafios.
Ciente disso, cabe à empresa decidir a melhor forma de tentar se recuperar financeiramente.
E o primeiro passo a ser dado é saber qual tipo de recuperação a empresa poderá requisitar, tendo em vista que no sistema brasileiro existem, atualmente, duas formas:
1 - A recuperação judicial;
2 - A recuperação extrajudicial.
Em ambas, a sociedade empresarial deve comprovar os mesmos requisitos, a saber:
I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;
III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;
IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
Logo, o ponto de partida de ambos os sistemas é idêntico.
No entanto, a primeira grande diferença entre os dois modelos reside no seguinte ponto: na recuperação extrajudicial não poderão ser incluídos os créditos de natureza tributária, derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho, assim como àqueles previstos nos arts. 49, § 3o, e 86, inciso II do caput, desta Lei.§ 2o O plano não poderá.
Na recuperação judicial, por sua vez, a vedação se dá apenas em relação aos créditos de natureza tributária e àqueles previstos nos arts. 49, § 3o, e 86, inciso II do caput, desta Lei.§ 2o O plano não poderá.
Por consequência, pode-se dizer que a recuperação judicial é mais ampla que a recuperação extrajudicial.
Outra diferença relevante está na forma de negociação: na recuperação extrajudicial a dívida pode ser negociada previamente com os credores e se a empresa requerente obtiver a anuência dos credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos o plano poderá ser homologado de forma obrigatória.
Ademais, na recuperação extrajudicial o rol de informações prestadas e o conjunto documental é muito inferior se comparado à recuperação judicial.
Então, basicamente a diferença entre os dois sistemas é que a recuperação extrajudicial é mais célere e gera menos custos. A recuperação judicial, por sua vez, é mais ampla e geralmente envolve passivos mais complexos.
Nesse sentido, é importante que a estratégia seja bem estabelecida e que a empresa com dificuldades financeiras faça uma auditoria completa para estabelecer qual o valor e qual a natureza das suas dívidas.
Com essas informações em mãos, se não houver outra forma de evitar a insolvência definitiva, cabe a sociedade empresarial, após cumprir os requisitos legais, utilizar aquilo que a lei brasileira tem de positivo para salvaguardar empregos, renda, arrecadação de tributos e desenvolvimento social e econômica, e que deriva justamente da função social das empresas.
Ou seja, o objetivo da lei é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Portanto, reconhecer bem qual a espécie de recuperação se enquadra na realidade da sociedade empresarial é o primeiro passo para se obter o sucesso de se cumprir o processo e voltar a operar normalmente no futuro.
Texto de Me. William de Aguiar Toledo. Advogado. Sócio da Aguiar Toledo Advogados. Mestre em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Doutorando em Direito pela Universidade Autônoma de Lisboa – UAL.