A pandemia causada a partir do surgimento do novo Corona vírus trouxe uma série de repercussões para as empresas. Dentre os desafios mais árduos, a administração do quadro de funcionários tem se mostrado tarefa espinhosa, sobretudo em decorrência do alto índice de afastamentos relacionados com a Covid-19.
No aspecto, para além do afastamento imposto a partir da efetiva contaminação do colaborador, ocorrida dentro ou fora do ambiente laboral, tem se mostrado também muito frequente no cotidiano empresarial o afastamento preventivo do empregado. Por “afastamento preventivo”, compreenda-se aquele ocasionado a partir do surgimento de sintomas que guardam relação com o vírus, porém sem comprovação laboratorial ou por teste apropriado. O afastamento cautelar, nesses casos, ocorre pelas seguintes razões: 1) existência de protocolos sanitários provenientes das autoridades em saúde; 2) atestado médico; e 3) ausência de testagem ou demora na divulgação do resultado do exame de detecção.
Na quase totalidade dos casos, o custo do afastamento do empregado repousa exclusivamente sobre a empresa, não raras vezes já castigada pelas nefastas consequências econômicas causadas pela pandemia.
Com a promulgação da Lei n. 14.151, de 12 de maio de 2021, um novo desafio surge para o empregador. Trata-se da obrigatoriedade de afastamento imediato da empregada gestante do trabalho presencial enquanto perdurar a emergência em saúde pública de importância nacional decorrente do Corona vírus. Nessa hipótese, segundo dispõe a novel legislação, a trabalhadora deverá permanecer à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo da sua remuneração.
O objetivo da lei, evidentemente, é proteger a gestante e o nascituro. Isso porque a gestante integra o grupo de risco, conforme evidenciam estudos científicos e estatísticas. O afastamento, portanto, teria o condão de reduzir significativamente a possibilidade de contaminação, em especial por dois motivos: 1) elimina-se a necessidade de deslocamentos “casa-trabalho” / “trabalho-casa”, em regra realizado por meio de transporte público; 2) evita-se o convívio com os demais trabalhadores no ambiente laboral.
Analisado o preceito legal sob o ângulo da empregada gestante, é de fácil conclusão que o legislador age com razoabilidade e com a cautela necessária para concretizar a proteção conferida pela Constituição Federal à maternidade e, por corolário lógico, à vida.
Ocorre que, a despeito da boa intenção do legislador, há aspectos que igualmente merecem atenção, sobretudo quando a apreciação do tema é direcionada para o enfoque da atividade produtiva.
O primeiro aspecto relevante, nesse norte, transita nas hipóteses em que a natureza da atividade até então desenvolvida pela obreira não permite que, uma vez afastada, possa exercer as tarefas em seu próprio domicílio. Em relação a isso, a lei 14.151 nada prevê, omissão que lança insegurança jurídica para o empregador, sobretudo para aqueles que, inseridos nessa situação, vislumbram uma alteração de função ou de atividades para que a funcionária afastada possa continuar prestando serviços.
Para além dessa dificuldade de ordem prática, a lei 14.151 traz outro problema significativamente acentuado ao empregador: a ausência de fonte de custeio para a manutenção do salário da empregada afastada, em especial nas circunstâncias em que não é possível a continuidade da prestação dos serviços no ambiente domiciliar.
Explica-se.
Não há previsão legal para enquadramento do afastamento da empregada gestante na hipótese de incapacidade laborativa, o que inviabiliza a concessão de benefício previdenciário. Da mesma forma, nenhuma disposição há em relação a percepção de benefício assistencial para amparar a empregada gestante no período de inatividade. Em decorrência da omissão legislativa e do princípio da proteção que norteia as relações de trabalho, a conclusão lógica é a de que deverá recair sobre o empregador o custo social do afastamento.
Ao nosso sentir, duas são as conclusões em relação ao disposto na lei 14.151/2021, à saber: 1) nas hipóteses em que a empregada afastada tenha condições de continuar prestando serviços ao empregador a partir do seu próprio domicílio, entende-se por mantido o equilíbrio contratual, pois a empregada prestará o serviço e o empregador fará a contraprestação adequada por meio do pagamento do salário; 2) nas hipóteses em que não seja possível a prestação dos serviços no domicílio da colaboradora, considera-se injusta a atribuição do ônus financeiro ao empregador, sobretudo em razão da grave crise econômica ocasionada pela pandemia da Covid-19 e, igualmente, por representar o afastamento da empregada gestante uma evidente situação de cunho social que deveria ser suportado pela sociedade como um todo, tal como é nas hipóteses de incapacidade para o trabalho.